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Acesso em 26/05/2025 às 01h05.

Mulheres na Engenharia – Novas profissionais quebram o estereótipo de uma profissão masculinizada

20 de dezembro de 2012, às 10h00 - Tempo de leitura aproximado: 10 minutos

   O “mundo” do ensino superior que antes era dominado pelo sexo masculino, hoje mostra a ascensão da mulher no mercado de trabalho. No âmbito geral da formação superior, as mulheres são hoje a maioria nos cursos de graduação e pós-graduação do país, representando cerca de 60% do número de matriculados (segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – PNAD/IBGE). Também é maior o percentual de mulheres que concluem a graduação (62%), conforme levantamento feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). 

 
   Na engenharia o crescimento também é notório. Embora as mulheres ainda sejam minoria no segmento, sua participação nos cursos da área teve significativo aumento. Ainda segundo dados do Inep, em 1991 elas representavam 17% do número de matrículas nos cursos de graduação das engenharias. Em 2000, a representação passou a 19% e, em 2008, já eram 21% do total.  
   “O ingresso das mulheres de forma maciça nas carreiras de nível superior é relativamente recente, data dos anos 1970”, afirma Maria Rosa Lombardi, socióloga e pesquisadora da Fundação Carlos Chagas. “Indubitavelmente, o leque de opções de profissões para elas abriu-se muito desde então, mesmo que, ainda hoje, as maiores concentrações de matrículas e conclusões femininas continuem em carreiras das ciências humanas e sociais, com destaque para a área da educação. A engenharia – e outras carreiras tecnológicas e científicas – definitivamente passaram a integrar as possibilidades profissionais das jovens e isso se reflete no aumento do número de matrículas nesses cursos”, avalia a socióloga, que também é doutora em relações de gênero, trabalho e profissões pelo Centre National de Recherches Scientifiques e Université de Paris X – Nanterre.
 
Crea Rondônia 
 
   Segundo o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), em 2009, as mulheres representavam 17% do número de profissionais registrados em todas as modalidades no sistema Confea/Crea – porcentual ainda pequeno comparado à participação masculina. Quais seriam os motivos para essa baixa participação das mulheres na área tecnológica, especialmente na engenharia? 
 
   Hoje, o Crea-RO conta com o número total de 775 mulheres cadastradas, sendo que 487 possuem nível superior (concluído em Rondônia) e com 288 são técnicas. Para o presidente do Crea-RO, Nélio Alencar, esse avanço do público feminino no segmento de engenharia é o espelho da valorização profissional delas no mercado de trabalho cada vez mais diversificado. “Hoje notamos que não existem mais profissões masculinas. As mulheres fazem, e se especializam, em áreas como a engenharia e agronomia e têm garantido seu reconhecimento.” Ele enfatiza também a importância do registro profissional. “As mulheres têm um diferencial, que é a preocupação com a excelência profissional. O registro no Crea firma que, além do talento inerente ao público feminino, o trabalho será feito com capricho e qualidade de um profissional registrado pelo Conselho. E isso é para qualquer estado, não só Rondônia”, enfatizou. 
 
   Para a vice-presidente da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE), engenheira civil Fátima Có, a grande questão para a escolha desta área para atuação está no condicionamento cultural. “É um processo que começa na infância, na forma como a questão da matemática, das ciências exatas, é colocada. Eu sempre fui muito observadora. Via que nos livrinhos da escola, na hora de mostrar uma criança fazendo contas, era sempre a figura de um menino que ilustrava, e nunca a de uma menina. Isso vai condicionando a mulher, que se sente excluída do desafio de buscar as ciências exatas”, avalia. Fátima acredita que existe também uma questão de escolha pessoal. “Há mulheres que preferem o conforto, outros tipos de carreiras. Não querem sair muito do lar, da família, correrem certos tipos de riscos. Junto a isso, há falta de incentivo para a área”, diz. 
 
   O presidente do Clube de Engenharia de Brasília, engenheiro civil Carlos Moura, acredita que há certo desinteresse feminino pela engenharia, mas não que haja restrição ou preconceito. “A engenharia, de certa forma, é uma profissão bruta. Uma coisa é a engenharia de escritório, de projeto, que talvez seja a engenharia mais pura. Já o acompanhamento, a engenharia de campo, é uma atividade mais pesada, que acaba desencorajando muitas mulheres. Nem todas estão dispostas a subir em andaime, descer num tubulão, assim como muitos homens também não. É uma questão de foro íntimo”, afirma. Ele cita como exemplo o caso de quando era diretor de uma empresa de geologia. “Nós fazíamos sondagens para barragens, no meio do mato. E tínhamos uma geóloga que ia para o campo, dormia em barraca e tudo. Sinal de que estava disposta a ir”, conclui.
 
   Para Maria Rosa Lombardi, a literatura feminista tem remarcado uma dupla resistência, ao mesmo tempo presente nas áreas tecnológicas e científicas e, por outro lado, demonstrada pelas próprias jovens. “Têm-se levantado algumas vertentes explicativas no caso da engenharia. Por exemplo, a sua origem militar, o trabalho de campo, muitas vezes em locais distantes, sujeito a intempéries e a alojamentos precários ou em ambientes fabris, a cultura profissional masculina, a necessidade de comandar equipes predominantemente masculinas. Não há dúvida, porém, que mesmo que não se possa mensurar o peso da discriminação de gênero – que inclui as imagens e estereótipos sociais do masculino e do feminino – ela está presente nos ambientes de trabalho e nas famílias, em diferentes graus e deve ser contada entre as causas da resistência feminina às carreiras da área tecnológica e científica”, garante.
 
Em Rondônia
 
   O Conselho em Rondônia apresenta, mesmo com a grande representatividade masculina na profissão, grandes nomes femininos em sua história. Segundo a geógrafa e ex-conselheira do Crea-RO, Maria Madalena Ferreira, o mercado de trabalho, mesmo dentro das profissões mais masculinizadas, ainda prefere o sexo feminino. Ela foi conselheira por dois mandatos e viu de perto o crescimento da mulher neste setor em Rondônia.  “Muitas profissões dentro desta área ainda tem predomínio do sexo masculino, isso é visto em qualquer lugar. Porém, nos últimos anos podemos notar a preocupação com a atuação feminina no mercado de trabalho, como concorrência, até pela tripla jornada que ela já se mostrou capaz de corportar (como mãe, dona de casa e profissional). É saudoso ver o crescimento do perfil empreendedor delas, que cada vez mais optam por ter seu próprio negócio”, destacou. 
 
   Madalena acompanha de perto o Fórum das Mulheres em Rondônia, que em Junho representará o estado no Rio+20 – Conferência da ONU que reunirá líderes do mundo todo na discussão de formas para transformar o planeta no que diz respeito ao meio ambiente. Ela acompanha o grupo de ex-conselheiras, que trabalha na pesquisa do perfil da mulher empreendedora em três estados brasileiros, sendo Rio de Janeiro, São Paulo e Bahia, para analisar onde elas estão empreendendo, crescendo e realizando consultorias. São geógrafas e engenheiras que se destacaram e hoje se dedicam aos estudos do segmento. 
 
   Em algumas áreas, como o meio ambiente, a mulher representa mais aceitabilidade e posicionamento acerca da tomada de decisões. ”A mulher tem certa facilidade em lidar com temas relacionados à saúde, meio ambiente e educação, tendo preferência em alguns casos.”
 
   A ex-conselheira ingressou no Crea-RO em 1988 e entrou como conselheira dentro da vaga disponível à Universidade Federal de Rondônia (Unir), onde permaneceu por 12 anos.  E tratando-se do Fórum das Mulheres, ninguém melhor que a Engenheira Agrônoma Celma Viana para explanar melhor o assunto. Segundo a ex-conselheira do Crea, a criação do Grupo se deu em um momento delicado de sua participação no Conselho, onde as mulheres ainda eram minoria. “Nessa época, o sistema Fisenge/Senge e o Confea/Crea vinham recebendo críticas de vários setores da sociedade organizada sobre a participação feminina em seus eventos, nas chapas para diretoria e até mesmo em posições de liderança, como conselheiras. Então, o Confea decidiu formar um grupo de trabalho para tratar, a princípio temporariamente dessa questão, convocando conselheiras federais, estaduais e regionais para juntas apontarem ações que culminassem no aumento da participação feminina no sistema. Porém, pouco destas iniciativas saíram do papel”, explicou a engenheira. 
 
   Ela explica que por outro lado, a Fisenge criou o Coletivo de Mulheres, que tratava ao mesmo tempo essa e outras questões, levando suas participantes à várias reuniões, onde era debatida a melhor forma de atrair as mulheres para a área de engenharia e consequentemente, para o movimento sindical.  “Realizamos o Seminário Mulher na Engenharia, com palestrantes – professoras da UNIR, engenheiras da UHE Santo Antonio, representantes de outros sindicatos, de órgãos públicos federais e estaduais, de movimentos sociais de ascensão da mulher dentro da Prefeitura de Porto Velho. Acredito que obtivemos êxito, pois houveram grandes participações no evento. Daí em diante, estávamos iniciando uma boa caminhada, articuladas com as mulheres dos mais diversos segmentos sociais e até políticos de Rondônia”, disse.  
 
   Celma salienta a escolha da profissão foi influencia da família de agrônomos e deixa um recado para as novas profissionais. “A atuação no mercado de trabalho está melhor para a mulher engenheira, pois atualmente o mercado não prioriza o sexo e sim a competência, mas mesmo assim precisamos de algumas mudanças: nas reuniões do Coletivo de Mulheres ouvi relatos de companheiras de outros Estados em que as profissionais muitas vezes recebem salários inferiores, onde a licença maternidade é menor que nos órgãos públicos, etc. Mas as conquistas são imensas. Hoje temos colegas engenheiras que de tanto insistirem agora fazem parte das mesas de negociação junto às delegacias do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). A esperança é que as políticas públicas direcionadas a valorização da mulher em todas as classes sociais realmente façam parte do nosso cotidiano”.
 
Por Larissa Vieira